Logo nos começos do século XIX, a agressão de Napoleão Bonaparte contra o nosso país atingiu as terras que hoje constituem o concelho de Albergaria-a-Velha e alguns acontecimentos ficaram dolorosamente marcados na memória do povo dignificado pela sua resistência contra o invasor.
A primeira invasão, comandada por Junot, entrou em Portugal em Novembro de 1807 (...)
Em Agosto do ano seguinte, os franceses foram derrotados pelo exército anglo-luso. (...)
Durante este período, pelas terras de Albergaria passaram destacamentos franceses e espanhóis que deixaram a marca lastimosa, por violenta e rapace, da sua ocupação.
Foi, porém, a segunda invasão francesa, entrada por Chaves, em Fevereiro de 1909, e comandada pelo marechal Soult, que aqui causou maior dano e sofrimento. Em 28 de Março o exército inimigo entrava no Porto, retardado pela acção das tropas portuguesas e da guerrilha permanente com que a gente do Norte semeava a angústia, a morte e a desorganização entre experimentados soldados bonapartistas.
Ocupada a cidade do Porto, Soult logo mandou seguir um destacamento de cavalaria até ao rio Vouga a fim de preparar a passagem do seu exército a caminho de Lisboa.
Tentando conhecer os pontos de vau e firmar posições, os franceses percorreram a margem direita, ocupando Mouquim, Serém, Alquerubim, S. João de Loure, Angeja e Albergaria-a-Velha onde entraram, em 30 de Março de 1809, os Dragões da cavalaria do general Franceschi.
Do outro lado do Vouga estavam as tropas portuguesas comandadas pelo coronel Trant e entre elas o Corpo Militar Académico formado por voluntários, estudantes da Universidade de Coimbra, entre os quais se encontravam alguns originários de povoações que são hoje parte do concelho de Albergaria, os quais se distinguiram em situações de combate, como consta da documentação da época que os cita nominalmente.
As gentes da região sentiram directamente a situação de guerra e as violências das tropas napoleónicas que começaram nas exigências despropositadas e acabaram no roubo, no espancamento, na violação e no assassinato. O povo - aqui, como em todo o Norte - reagiu atacando o invasor.
Nunca houve uma guerrilha organizada, mas apareciam pequenos grupos nas zonas mais sensíveis e iam emboscando os franceses, eliminando os isolados e os correios, numa acção desgastante, fortemente perturbadora pela insegurança e danos que causavam.
Foi de Albergaria-a-Velha que partiu a insurreição popular que alastrou ao longo da linha do rio Vouga numa acção esporádica por toda a zona, a avaliar pelos locais onde muitos albergarienses cairam assassinados. De quinze se conhecem os nomes, residências e lugares onde foram sepultados, bem distantes uns dos outros, graças aos cuidadosos registos do Padre Manuel Fernandes Arêde, Cura da freguesia nessa época, e a uma acta da Câmara Municipal.
A acção destes heróis da Resistência não foi nem quixotesca nem vã porque contra eles o general francês teve de ordenar violentas medidas repressivas.
A desmultiplicação e movimentação da sua actividade levou os inimigos a suporem que o seu número atingia 8.000 elementos de tropas organizadas, como refere o oficial francês A d’Illens, o que era tão irreal como absurdo.
No dia 10 de Maio, o exército anglo-luso, que na véspera se havia reunido e acampado ao sul de Albergaria-a-Velha, avançou rapidamente sobre as forças francesas postadas nos pinhais entre as duas albergarias. Derrotados, os franceses tiveram de retirar apressadamente para Albergaria-a-Nova, deixando na batalha de Albergaria o fruto dos muitos roubos cometidos, além de armas, fardas e até botas.
Albergaria-a-Velha foi libertada em 10 de Maio de 1809 depois de luta violenta, como revela Luz Soriano — "Em Albergaria- foram os franceses por mais outra vez atacados e lançados fora, sendo os primeiros que entraram naquela vila os Caçadores Portugueses que, de toda a tropa inglesa, mereceram grandes elogios pela sua bravura e sangue frio".
Mas se mereceram ser honrados estes soldados portugueses, gente anónima que lutava contra o invasor, deve-o, ser igualmente o povo das terras do concelho de Albergaria-a-Velha por ter lutado, mesmo até ao desespero da morte, por ter sofrido, mesmo até à dor mais cruenta, na certeza da vitória e da liberdade.
Fonte: António Homem de Albuquerque Pinho, “Albergaria-a-Velha – Oito Séculos do Passado ao Futuro”
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