terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Apelo de José Frias de Oliveira a Manuel Costa e Melo (1958)

Eu [Costa e Melo] tinha amiudados contactos com alguns emigrantes que, por motivos políticos ou económicos, de mera subsistência própria ou dos seus, haviam buscado terras alheias para respirar ou viver.

Um deles era o José Frias de Oliveira, de Alquerubim, radicado na Venezuela. Era e é, felizmente, um homem franco e directo que estabeleceu contacto comigo, pela primeira vez, já lá vão muitos anos.

Lembra-me ter ido a Albergaria-a-Velha a cujo concelho Alquerubim pertence, pedir ao Leandro Gomes Ferreira, o saudoso Leandro, que muito me ensinou na prática notarial, me ajudasse a saber quem era o Frias e se [era] pessoa a quem pudesse dar-se confiança política.

A P.I.D.E. usava todos os meios e poderia até acontecer ser o Frias que me escrevia e confidenciava anseios, um desses «correligionários» com tarefa bem definida de denunciar. Até levei cartas. Confrontámos letra e assinaturas. O Leandro já o conhecia e sabia ser o Frias um homem de bem e ideias sãs.

Foi para mim um alívio e tão grande que era por ele que mandava e recebia muito do aqui interdito pela sanha persecutória dos fantoches malditos. E nunca mais deixámos arrefecer essa velha ligação tão necessária, ao tempo.

E veio já, esta pequena incursão nas áreas de ligação com o Frias, porque julguei oportuno trazer aqui e a propósito das candidaturas de Delgado e Arlindo Vicente, um apelo que dele recebi e me tocou no mais fundo da minha alma militante anti-fascista.

Apelo a propósito das candidaturas de Humberto Delgado e Arlindo Vicente

Mas voltemos ao Frias para vos mostrar a simplicidade ansiosa do seu apelo.

Era de 19 de Maio de 1958 a sua carta e, para além da confissão do interesse por quanto se passava na Pátria distante, dizia:

«Já vai sendo tempo de o nosso exército compreender a situação em que se encontra o país e os seus filhos. Já vai sendo tempo de acabar a cobardia e o medo de certos oficiais das nossas forças armadas.

Que seja já o momento de acabar com a ditadura duma vez para sempre: «Que se morra lutando pelos nossos direitos, mas não nas mãos da P.V.D.E.

Rogo a V. Ex.° se digne fazer todos os esforços para que o candidato democrata Dr. Arlindo Vicente desista da sua candidatura e formem um só bloco em favor do Candidato General Humberto Delgado.»

E é curioso como o Frias e com ele a numerosa comunidade portuguesa da Venezuela já ansiava, a 19 de Maio, pelo que veio a verificar-se, onze dias depois, com o tão depreciado «Pacto de Cacilhas». Não ouso afirmá-lo mas sinto que o apelo do Frias não deve ter estado alheio ao subconsciente que determinou a minha pequena mas frontal acção no aperta[r] de mãos entre Delgado e Arlindo Vicente.

Fonte: Costa e Melo

Imagem: Dr. Costa e Melo

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