terça-feira, 20 de novembro de 2018

Reconhecer a relevância da Caima na história de Portugal


A historiografia portuguesa desprezou a análise do papel da Caima na economia nacional. O trabalho desenvolvido por Jorge Custódio, Sara Costa Macedo e Susana Pacheco outorga à Caima o papel de destaque que merece na história de Portugal.

A possibilidade de estudar uma empresa que esteve presente em todos os momentos mais significativos da transformação da sociedade portuguesa desde o fim do século XIX é de uma grande relevância. A Caima começou a existir durante o reinado de D. Luís, cresceu durante a Primeira República, esteve sempre activa na I Guerra Mundial, na ditadura militar, na II Guerra Mundial, no 25 de Abril de 1974, na integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia (CEE) – agora União Europeia –, na adopção da moeda única e no fim do escudo.


De Albergaria (1888-1993) a Constância (1960-2018)

A fundação da Caima data de 17 de Maio de 1888. A Fábrica de Albergaria [mais concretamente em Carvalhal, na actual freguesia da Branca] está construída em meados de 1891. Para construir uma fábrica para produzir pasta de papel, por processo químico inovador, no interior de Portugal, nos finais do século XIX, foi necessário trazer o equipamento completo e uma equipa da Alemanha para montar a fábrica. “Imagine o que era constituir uma fábrica em Portugal, têxtil ou metalomecânica, para as quais a formação técnica era baixa nessa época e não existia mão-de-obra especializada. Quanto mais não seria quando esta unidade era uma indústria química à base de bissulfito de cálcio.”, diz Jorge Custódio, responsável pela coordenação do trabalho de investigação da Caima.

“Ao fazer a história desta empresa [a primeira fábrica de produção de pasta química em Portugal], estamos a falar da história da própria sociedade da região e do País”, afirma Sofia Costa Macedo.


Ponto de partida

O ponto de partida da investigação foi uma arca existente na empresa que tinha cerca de 150 documentos sobre a "The Caima Timber Estate & Wood Pulp Company, Limited" [activa entre 1888-1921]. Para desenvolver o trabalho consultaram vários arquivos diferentes. Os existentes na fábrica de Constância e na fábrica de Albergaria – de que grande parte se encontra no arquivo municipal de Albergaria-a-Velha –, assim como arquivos estatais, municipais e distritais, entre os quais os do antigo Ministério das Obras Públicas e do Ministério da Economia, nos quais encontraram bastante informação.

Recorreram também a arquivos estrangeiros, nomeadamente ao National Archives, em Inglaterra. Foi em Londres que encontraram os estatutos originais da criação da "The Caima Timber Estate & Wood Pulp Company, Limited", a informação mais antiga da Caima. Só de Inglaterra pesquisaram e trouxeram mais de 300 documentos.

Ao todo, encontraram mais informação do que esperavam. Informação que teve de ser analisada e validada para saber se era relevante para a investigação. No arquivo de Albergaria encontraram mais de 200 itens, com vários documentos integrados em cada item. São volumes de cartas. Só para se ter uma noção: num volume, um item possui 600 cartas.


Matriz científica e histórica

O responsável pelo projecto conta que vão escrever um livro de matriz científica. “Não é um discurso ideológico, é científico.”

Outro aspecto muito relevante deste trabalho foi dar uma dimensão humana à história. “Quem foram as pessoas, o seu papel, como se destacaram, que influência tiveram nas medidas adoptadas pela empresa e quais foram os seus resultados práticos para o negócio”, diz Sofia Costa Macedo. Um sentimento reforçado por Jorge Custódio, ao referir que este aspecto é “interessante e deu origem a mapas que vão estar na exposição e no livro, mostrando a universalidade da Caima”.

Uma mostra da universalidade da Caima foi a sua relação com o diário britânico The Daily Telegraph. Este importante jornal fundado em 1855, continua a ser um dos mais relevantes do Reino Unido e durante muito tempo utilizou papel produzido com pasta da Caima.


Tecnologia utilizada

“Encontrámos toda a tecnologia utilizada nas fábricas. No início, nunca pensei que fosse possível recriar uma fábrica como a de Albergaria que está em ruínas e saber que máquinas existiram”, explica Susana Pacheco. Os investigadores conseguiram encontrar diversas plantas de tecnologia, com as dimensões da época e a forma como se instalavam esses equipamentos. Quem foram os construtores, os tamanhos de cada peça e as máquinas em causa. “Há um grande conhecimento e detalhe de todo o processo evolutivo da tecnologia utilizada pela Caima”, diz Susana Pacheco.


Meios de divulgação (livro, exposição, conferências, arquivo digital)

O trabalho que os investigadores estão a desenvolver é a produção de um livro que conte a história da Caima, uma exposição para levar este conhecimento às pessoas e conferências temáticas a iniciar em Novembro. Desde o início do projecto a equipa pensou na importância de tratar e disponibilizar o arquivo do material encontrado. Uma ideia que acabou por ganhar eco dentro da própria Caima, abrindo a possibilidade de “se fazer a localização do arquivo digital numa drive onde consta tudo o que investigámos”, diz Jorge Custódio. Para o responsável deste ambicioso projecto, esta situação vai permitir que uma pessoa pesquise o que quiser nesse espaço, tendo em conta que toda a informação está tratada e organizada.

O livro será uma síntese de tudo o que foi analisado. “Vamos fazer análises correctas que contribuirão para um melhor conhecimento da Caima.” (...)


Percurso

1888 (17 de Maio) - Fundação da Sociedade The Caima Timber Estate & Wood Pulp Company, Ltd. [com instalações industriais no concelho de Albergaria-a-Velha]

1891 - Inauguração da Fábrica de Pasta de Papel da The Caima Timber Estate & Wood Pulp Company, Ltd., instalada mas margens do rio Caima, produzindo pasta pelo processo do bissulfito de cálcio a partir de madeira de pinheiro.

1892 - Exportação da pasta de papel da Caima para a fábrica Star Paper C.º, em Inglaterra.

1907 - Início da produção experimental de pasta de papel a partir de eucalipto, promovida pelo inovador E. D. Bergqvist, sobrinho do pioneiro sueco, Carl Ekman.

1921 - Inicio da comercialização da pasta de papel de eucalipto fabricada na Fábrica do Caima.

1922 (19 de Abril) - O nome da sociedade passa a ser Caima Pulp C.º, Ltd.

1945 - Data em que se deixou de fabricar, na fábrica do Caima, pasta de papel a partir do pinheiro.

1956 - Instalação da concentração de licor na fábrica de Albergaria.

1956 - A holding Eucalyptus Pulp Mills Ltd decide construir uma nova fábrica em Portugal, em Constância, Distrito de Santarém. O processo selecionado é bissulfito de cálcio.

1957 - Arranque da produção de pasta branqueada de eucalipto em Albergaria.

1959 - Reorganização da holding.

1960 - Construção da Fábrica de Constância, da Caima Pulp C.º, Ltd. Instalação das Caldeiras de Recuperação.

(...)

1973 - Alteração da designação social para Companhia da Celulose do Caima, S.A.R.L.

(...)

1992 - Alteração do processo da Fábrica de Albergaria para o fabrico da pasta pelo bissulfito de magnésio, como tinha já acontecido em Constância.

1993 - A laboração em Albergaria-a-Velha é suspensa de forma permanente.

1994 - As instalações da fábrica, no rio Caima, são adquiridas pela papeleira REFICEL – Sociedade e Recuperação de Fibras Celulósicas.

(...)

2002 - Constituição da Caima – Indústria de Celulose, S.A. e transformação da Companhia de Celulose do Caima em S.G.P.S.

(...)

2005 - Fundação da ALTRI, em resultado da reestruturação da Cofina, através de um spin-off dos activos industriais.

Fontes: Altrinews (adaptado) / Caima (percurso) / Facebook

1 comentário:

Blogger disse...

http://www.mediotejo.net/constancia-descobrir-a-historia-da-caima-a-partir-de-um-misterioso-bau/